Geração Z está preparada para o setor público? Veja o que dizem os especialistas
- CeprevNews
- 11 de abr.
- 7 min de leitura

A geração Z entra no mercado de trabalho com um leque de possibilidades. Dentre elas, o setor público chama atenção dos novos profissionais
Os estereótipos do setor público apontam para servidores mais velhos e burocratas. Mas, as novas gerações vem ocupando cada vez mais os espaços e as repartições Brasil afora, e mudando esse cenário. O comportamento da geração Z no mercado de trabalho, seja público ou privado, é assunto de pesquisas no mundo inteiro.
74% dos jovens acreditam que seu desenvolvimento profissional impacta na autoestima e no bem-estar, de acordo com pesquisa da empresa de saúde Alice, em parceria com BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo, Grupo Fleury e Flash.
Nascidos entre 1997 a 2010, a geração Z é a primeira a ser nativa digital. Ou seja, não conhecem um mundo sem internet. O acesso rápido e fácil à informação moldou o perfil curioso, ágil e inovador desse grupo. Que, no mercado de trabalho, não é muito diferente.
Por causa do seu retrato voraz, sempre ativo e em busca de novidades, é comum pensar que a geração Z quer liberdade para experienciar diversas profissões, e a estabilidade do serviço público ficaria em segundo plano ou nem sequer considerada. Mas, o cenário não é preto no branco.
Com a onda de aposentadorias entre servidores, novos concursos públicos são abertos no país. O Censo de Concursos Públicos de 2023, realizado pela Qconcursos, trouxe o perfil do concurseiro brasileiro. Dentre as características, a média de idade dos candidatos chama atenção: de 25 a 39 anos.
Hoje, são 11 milhões de servidores públicos no país, segundo dados do Instituto República.org. 1 em cada 8 trabalhadores brasileiros está no serviço público. O número pode parecer alto, mas, na prática, representa apenas 12% da força de trabalho.
O Brasil tem menos servidores do que outros países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), em que a média das nações participantes, como Chile e Dinamarca, é de 23,48%, de acordo com dados da International Labour Organization (Ilostat).
A geração Z representa uma parcela significativa da força de trabalho, que deve chegar a 30% no próximo ano, segundo pesquisa da Intelligent.com. Com um leque de possibilidades, esse grupo também abre os olhos para o setor público.
Da segurança pública à mobilidade urbana, o serviço público está em todo lugar. Para jovens, como Lua e Sami, trabalhar no setor era um sonho, que foi realizado em 2024. Conheça suas histórias.
"Propósito que apaixona": como a geração Z enxerga o serviço público?
Para Lua Chiara, de 22 anos, é difícil saber quando ela decidiu ser servidora, já que o desejo vem de casa. Seu pai, Iran, é técnico de logística na Petrobras, e a mãe, Jerusa, trabalha como assistente social no Departamento Geral de Ações Socioeducativas (DEGASE), no Rio de Janeiro. Com a trajetória de seus pais, ela aprendeu o valor do estudo.
“Eu vi meus pais conquistarem tudo através do serviço público. Passar no certame, sempre me pareceu a melhor opção para alcançar uma vida financeira confortável, estável e realizar meus sonhos”, diz. O objetivo de ser servidora também a levou à faculdade de Direito. “Sabia que o curso me abriria oportunidades de bons concursos”, conta. Hoje, Lua concluiu o último semestre do curso, já aprovada na OAB, e nem precisou esperar a formatura para se tornar funcionária pública.
Natural do Ceará, mas morando no Rio de Janeiro, em abril deste ano, Lua assumiu o cargo de Assistente Administrativa no Instituto Federal Fluminense. Seus colegas mais velhos costumam falar que Lua tem “brilho nos sonhos” quando pensa no serviço público.
A estabilidade encanta, mas não é o único motivo para a paixão. Para ela, o serviço público enche o servidor de dignidade. "Como trabalho em um Instituto Federal, vejo cada dia mais a importância da educação na vida dos jovens e o impacto da instituição na sociedade", afirma.
A contratação PJ bate recordes no país, são 13,9 milhões de trabalhadores nessa modalidade, segundo dados do IBGE. A carreira pública vai na contrapartida desse aumento, trazendo estabilidade aos servidores. Lua acredita que, por mais que o mercado de trabalho venha sendo precarizado, a nova geração também tem adquirido cada vez mais consciência dos seus direitos.
"Nós conhecemos a valorização do trabalho e dos limites que devem ser impostos dentro desse ambiente. A geração Z não aceita 'qualquer coisa por trabalho', então observo um interesse pela carreira pública. Nesse mundo que vende 'ganhe dinheiro fácil', os jovens buscam estabilidade", defende.
Lua acredita que, o cenário de incerteza trabalhista e sensação não conseguir alcançar os objetivos, também leva os jovens aos concursos públicos. Para os futuros concurseiros, a cearense indica focar em uma carreira e dedicar-se no preparo. Ela passa para frente um conselho de sua mãe: "Minha mãe sempre fala: 'A gente não faz concurso para passar, a gente presta até passar".
Geração Z no mercado de trabalho: comportamento nos espaços públicos e privados
Para William Dornela, professor, sócio-diretor do curso preparativo Os Pedagógicos e servidor da Secretaria de Educação do Distrito Federal, um bom servidor público deve ser comprometido, ético e resiliente, capaz de atuar com eficiência mesmo diante das limitações estruturais e de valorização da carreira.
Tendo essas características em mente, surge a pergunta: o serviço público também é lugar para geração Z? A resposta é: sim. Seja no mercado de trabalho público ou privado, as empresas ainda estão aprendendo a lidar com a geração Z.
Como explica a psicóloga Bruna Lima e Silva, ter crescido no mundo digital forneceu a geração Z o consumo rápido de informação e a habilidade de lidar com múltiplas plataformas ao mesmo tempo. Eles são antenados e adaptáveis, inclusive no mercado de trabalho.
Bruna também aconselha que é importante se preparar para possíveis decepções no momento de buscar o trabalho ideal. "Investir em inteligência emocional, comunicação e saber lidar com frustações é essencial", explica.
"O mercado de trabalho nem sempre vai oferecer respostas rápidas ou reconhecimento imediato que essa geração espera. Entenda que o crescimento profissional é um processo", afirma. Na hora de procurar um emprego, muitos priorizam a busca por algo que os forneça próposito.
E, de próposito, o serviço público está cheio. "O impacto social do trabalho pode trazer motivação", diz ela. Para William Dornela, outros pontos também levam os jovens para o setor público. "Enquanto as gerações anteriores buscavam o reconhecimento profissional acima de tudo, a geração Z valoriza a estabilidade e equilíbrio entre trabalho e vida pessoal. Benefícios que são encontrados em mais cargos públicos do que na iniciativa privada", opina.
William também enxerga um momento de transição no serviço público. Aproveitando a leva de aposentadorias e a inserção de modernização tecnológica na gestão dos processos, a Geração Z entra para transformar o setor com uma mentalidade mais inovadora, digital e voltada para resultados.
Para William, são muitas as vantagens de trazer os jovens para a iniciativa pública. Da conexão com tecnologia, que deixa os sistemas mais automatizados, ágeis e acessíveis, a visão colobarativa. "A geração Z é engajada e promove práticas alinhadas aos princípios de ESG. Eles valorizam um ambiente de trabalho mais dinâmico e pautado em propósito, o que pode fortalecer a eficiência e a conexão entre governo e sociedade", diz.
De juiz a procurador: novos advogados no serviço público
O Direito proporciona uma gama de oportunidades de trabalho no setor público. As mais populares incluem juiz, delegado, defensor público e procurador. Dentro das funções da última, está consultoria e assessoria jurídica e promoção de ações judiciais, é isso que Sami Salim faz na Procuradoria Municipal de Aquidauana, no Mato Grosso do Sul.
Aos 24 anos, Sami formou-se em Direito em março de 2024 e tomou posse do cargo em novembro. Com o pai também advogado, Sami sempre soube que seguiria para essa área, mas a carreira exata ainda era nebulosa. "Meu pai queria que eu seguisse para advocacia privada, já eu queria ser juiz", conta.
A carreira de Magistratura é um dos cargos mais concorridos em certames públicos do país. Além da graduação completa, é preciso comprovar, no mínimo, 3 anos de experiência profissional na área. Durante a graduação, Sami acabou abrindo os olhos para outras opções de carreira, e um encantou: procurador.
"Defender o munícipio, gerando economias que podem ser investidas em áreas que realmente necessitam, é muito bom. Eu amo o que eu faço. É uma carreira espetacular, que beneficia diretamente o cidadão", comenta.
Sami atua na área judicial da Secretaria Municipal da Saúde. No trabalho, tem uma dupla, Irene. "O meu tempo de vida é o tempo de trabalho que ela tem no SUS. Com as trocas, eu sempre aprendo muito", afirma.
O mato-grossense lembra, com risadas, da festa de boas-vindas. "Na hora de me apresentar, falei minha idade e todo mundo riu, brincando, que não ia falar da própria idade", conta. Mas, para conquistar a aprovação tão jovem, o preparo para concurso começou 3 anos atrás.
Do quinto ao oitavo semestre da graduação, Sami criou uma rotina de estudos, de 2 a 5 horas por dia, de segunda a sábado. "Concurso não é para genio, é para quem consegue manter uma constância de estudo e aguentar um pressão absurda".
Na trajetória, prestou mais de 20 concursos, conquistando aprovação em 7. Para inspirar outros candidatos, Sami começou a produzir conteúdo nas redes sociais. "Tem gente do segundo ano do ensino médio que entra em contato, falando que quer prestar concurso. Eu até falo: “Calma entra na faculdade primeiro antes”, brincando.
Do TikTok ao Instagram o profissional busca dar mentoria para outros concurseiros. "Busco direcionar meu conteúdo para quem ainda está na faculdade, e quer começar a se preparar para os concursos. Procuro cobrar um valor mais acessível, para que o ensino seja democratizado", diz. Para, Sami, o futuro do Direito e da qualidade de serviço público está no concurso público.
Fonte: Estadão
Foto: Freepik
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